Acidigital
Dom Juan Ignacio Arrieta, secretário do Dicastério para os Textos Legislativos e especialista em Direito Canônico, falou com a ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, sobre as novidades introduzidas no documento promulgado pelo papa Francisco para lidar com o abuso sexual na Igreja.
Trata-se do motu proprio Vos estis lux mundi (Vós sois a luz do mundo), publicado pela primeira vez em 2019 ad experimentum após a cúpula mundial dos bispos na Santa Sé, em fevereiro daquele ano, para abordar o tema do abuso na Igreja.
Em 25 de março, o papa Francisco promulgou o documento final, que entrará em vigor em 30 de abril de 2023.
Dom Juan Ignacio Arrieta é também Doutor em Direito Canônico pela Universidade de Navarra, Espanha, e é professor de Direito Canônico desde 1987. Ele acompanhou de perto a elaboração deste documento, já que serve no que era o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos desde 2007.
Recepção das denúncias de forma segura
Arrieta disse à ACI Prensa que agora algo “que era provisório para recolher experiências a partir do que o papa fez em 2019” se tornou definitivo.
O objetivo é que as denúncias de abusos ou outros tipos de questões “cheguem a quem deve julgá-las”.
“É preciso entender que a Igreja se move nos cinco continentes, é uma realidade que está em contato com muitos países, e há certas pessoas como bispos ou superiores que dependem do papa”.
Por isso, “é necessário que as denúncias cheguem das Filipinas ou dos EUA a Roma de forma segura”, diz.
Novidades mais importantes
Sobre as novidades da versão final do documento, o bispo da Opus Dei recorda que nos últimos anos foram acrescentadas várias precisões ao “Livro VI do Código de Direito Canônico, que trata do direito penal, com o qual alguns delitos canônicos foram mais bem definidos”.
“Existe uma experiência nova e com esses dados foi feita uma nova lei, que é a mesma de antes com algumas pequenas modificações”, diz.
Adultos vulneráveis
Uma das variações que surgiram em 25 de março de Vos estis lux mundi é que estabelece que as normas se aplicam quando há “um delito contra o sexto mandamento do Decálogo (Não cometerás atos impuros) cometido com um menor ou com uma pessoa que habitualmente tem um uso imperfeito da razão ou com um adulto vulnerável”.
Para o bispo, “o conceito de ‘adulto vulnerável’ ainda não está muito fixado na doutrina”.
“Como a Igreja trabalha nos cinco continentes, a sensibilidade na Índia não é a mesma que na Espanha ou em outro país”.
“Na legislação canônica universal não se utiliza o termo ‘vulnerável’, mas sim o termo ‘pessoas que juridicamente merecem a mesma proteção que os menores ou pessoas portadoras de algum tipo de deficiência'”, disse o bispo.
Ele diz que todos esses tipos de expressões “são conceitos legais que a Igreja deve aplicar em países muito diferentes e que foram muito definidos no Código e também nas normas do Dicastério para a Doutrina da Fé”.
Leigos responsáveis
Segundo o documento atualizado, agora também será possível investigar os leigos responsáveis pelos movimentos eclesiais.
Dom Arrieta diz que com isso “a Santa Sé também quer proteger esses setores e dar liberdade a que também estas pessoas que ocupam cargos de maior responsabilidade estejam sob a garantia de que o seu comportamento obedece ao que é a doutrina da Igreja e à correta moral cristã”.
“Inconvenientes derivados do abuso de autoridade”
O novo texto contempla as acusações que noviços, seminaristas ou freiras possam fazer, não só por abusos sexuais, mas também por “inconvenientes derivados do abuso de autoridade”.
O bispo entende o abuso de autoridade como “a invasão da consciência ou a tentativa de influenciar ilegitimamente a consciência das pessoas, ou porque envolvem mandatos ou ordens que não são legitimamente dadas”.
São, portanto, “formas de consciência ou ordens que se dão. Não necessariamente estão relacionadas ao abuso de tipo sexual, mas podem ser de outro estilo. E se forem graves, também entram como crimes que devem ser julgados e castigados eventualmente”.
Prazos e procedimentos
Arrieta esclarece que “uma coisa é que a denúncia chegue ao seu site e depois, uma vez verificado o conteúdo da denúncia, ela deve ser julgada segundo os procedimentos estabelecidos pela Igreja”.
Também esclarece que “o Dicastério que recebe a informação deve decidir dentro de um mês quem deve iniciar essa investigação para verificar se a denúncia é correta ou não”.
O objetivo desta nova atualização do texto é, em suma, “que se possa concluir melhor e que as coisas sejam mais bem resolvidas”.
“A definição está sendo aprimorada, devemos perceber que as leis da Igreja são leis que devem ser aplicadas em contextos muito diferentes, por isso é necessário fazer regras que se adaptem às exigências de cada lugar”, diz Arrieta.
Por fim, diz que é preciso até “refinar aspectos que aparecem e às vezes são muito técnicos” para aprimorá-los e aplicá-los efetivamente em todo o mundo.